Por Joabe Antonio de Oliveira, Servidor Público do Ministério da Saúde há mais de 15 anos | Radar da Saúde
É com a profunda preocupação de quem acompanha de perto a saúde pública brasileira há mais de 15 anos que trago a público os dados mais recentes sobre o diabetes. Esta não é apenas uma doença crônica; é, inequivocamente, uma crise de saúde pública que coloca o Brasil no centro de uma epidemia global. Os números do novo Atlas de 2025 da Federação Internacional de Diabetes (IDF) e os levantamentos internos do Ministério da Saúde (Vigitel) e da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) são um alerta urgente que exige mobilização de toda a sociedade.
O Brasil no Ranking Global: Uma Posição Preocupante
O cenário nacional é alarmante e coloca nosso país em posições de destaque nos rankings que preferiríamos não ocupar.
Hoje, o Brasil conta com 16,6 milhões de pessoas entre 20 e 79 anos convivendo com o diabetes. Essa estimativa, baseada no atlas global de 2025 da IDF, reflete uma prevalência estimada em 10,5% da população. Outras projeções, considerando o Censo 2022 e a frequência de diagnóstico autorreferido (10,2% pela pesquisa Vigitel), indicam que o país já tem cerca de 20 milhões de pessoas com a doença.)
Com esse montante, o Brasil é o 6º país no ranking mundial em número total de casos de diabetes, liderando a lista na América do Sul e Central.
E o problema está se acelerando:
• Registramos um crescimento de 5,7% nos casos em relação aos dados do atlas de 2021 – uma alta de quase 6% no índice de pessoas com diabetes no Brasil.
• A projeção é que a situação se agrave, com a expectativa de que o Brasil tenha ao menos 24 milhões de indivíduos convivendo com a doença até 2050.
O Perigo Silencioso: Subdiagnóstico e Pré-diabetes
O maior desafio para o Sistema Único de Saúde (SUS) não é apenas tratar os casos conhecidos, mas alcançar aqueles que ainda circulam sob risco, sem saber que têm a doença.
O Atlas da IDF aponta que 32% dos adultos com níveis de glicose alterados no Brasil estão sem o devido diagnóstico. Isso significa que cerca de 1 a cada 3 pessoas com diabetes não sabe que tem a doença, expondo-se a complicações de curto e longo prazo. Essa taxa de subdiagnóstico coloca o Brasil como a nona nação do mundo com o maior número de pessoas sem o quadro detectado.
Além disso, temos uma vasta população na iminência de desenvolver a condição: 11% dos adultos no país já possuem pré-diabetes. Isso representa cerca de 17,7 milhões de cidadãos correndo alto risco de conversão para o diabetes em si.
O Custo em Vidas e Recursos Financeiros
A dimensão do diabetes enquanto problema de saúde pública é reforçada pelo seu impacto na mortalidade e no orçamento nacional:
1. Mortalidade: O diabetes foi ligado a 111.000 mortes no Brasil em 2024. Para colocar em perspectiva, a doença matou 20 vezes mais que a dengue no mesmo ano. É fundamental notar que este número pode estar subestimado, já que muitas vezes o diabetes é um fator contribuinte para desfechos fatais, como infarto e AVC.
2. Complicações Graves: O descontrole glicêmico está por trás da principal causa de amputação não traumática de membros inferiores no país. O diabetes é responsável por mais de 28 amputações de pernas e pés por dia no Brasil. Em 2022, foram realizadas 10.168 operações.
3. Impacto Financeiro: Somos o terceiro país no mundo em gastos com diabetes, perdendo apenas para gigantes como EUA e China. O Brasil aloca 45 bilhões de dólares por ano para o tratamento do problema e suas sequelas. Em termos de gastos diretos, o valor ultrapassa os R$ 42 bilhões por ano.
Veja os números
O Peso do Diabetes no Brasil (Dados IDF 2025)
Prevalência e Posição Global
O Desafio do Subdiagnóstico
Impacto Financeiro
Gastos diretos: Mais de R$ 42 bilhões por ano (dados do Brasil)
Estes valores incluem custos com medicamentos, internações, consultas e complicações relacionadas ao diabetes.
Projeção de Crescimento
Dados de Complicações e Tipos Específicos
Categoria | Dados |
---|---|
Mortes (2024) | 111.000 |
Diabetes Tipo 1 | 499 mil pessoas (4ª posição global) |
Diabetes Gestacional | Afeta 11% das gestações |
Amputações (Pernas e Pés) | Mais de 28 amputações por dia |
Pessoas com Pré-Diabetes | 17,7 milhões de adultos (11% da população) |
O Desafio da Atenção Primária e a Complexidade do Diabetes
Embora a maioria dos casos (cerca de 90%) seja de Diabetes Tipo 2 (DM2), associado principalmente a fatores como obesidade, má alimentação e sedentarismo, o Diabetes Tipo 1 (DM1) também representa uma grande preocupação:
• Quase 500 mil brasileiros apresentam DM1, o que nos coloca como o quarto colocado no ranking global de pessoas com essa condição. Outras fontes indicam que afetamos aproximadamente 600 mil pessoas, ocupando o 3º lugar global em casos de DM1.
O SUS, através da Atenção Primária à Saúde (APS), desempenha um papel essencial no manejo desta doença crônica, oferecendo suporte contínuo, diagnóstico precoce, acompanhamento regular e tratamento gratuito. Contudo, a efetividade da APS ainda enfrenta obstáculos:
• Desigualdade no Acesso e Estrutura: A precariedade estrutural das Unidades Básicas de Saúde (UBS) em diversas capitais compromete o acesso a exames e insumos essenciais. Embora tenha havido avanços na oferta de medicamentos e equipamentos, desafios como desigualdades regionais e a necessidade de incorporação de novas tecnologias persistem.
• Diagnóstico Precoce: É fundamental intensificar o rastreamento, pois a identificação precoce do diabetes (classificado como Condição Sensível à Atenção Primária – CSAP) pode evitar complicações graves, internações e óbitos.
• Adesão ao Tratamento: Embora a adesão ao tratamento medicamentoso seja alta (84,1% em um estudo), o desafio está na adesão às mudanças no estilo de vida. Apenas 29,4% realizavam atividade física regularmente e 24% seguiam uma alimentação adequada.
O Caminho à Frente: Investimento e Inovação
Como servidor do Ministério da Saúde, reafirmo que o combate ao diabetes exige políticas públicas robustas. O desafio não é apenas médico, mas social e econômico.
Reduzir o impacto do diabetes depende da ação imediata e coordenada entre gestores, profissionais de saúde e toda a população. Precisamos reforçar o investimento na estruturação das UBS, garantir o acesso a medicamentos e insumos de ponta e expandir programas de educação em saúde e suporte emocional para os pacientes.
É imperativo que todos entendam a seriedade desses números. O diabetes é uma ameaça crescente que só poderá ser contida se atuarmos juntos na prevenção, no diagnóstico precoce e na garantia de um tratamento adequado e equitativo para os milhões de brasileiros afetados.
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Este artigo é baseado nos dados estatísticos do Atlas Global de 2025 da Federação Internacional de Diabetes (IDF), em levantamentos da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) e nos resultados de pesquisas sobre a Atenção Primária à Saúde (APS) no Brasil.
Revisado pelo Médico Especializado em medicina ortomolecular Dr. Josê Henrique Tamburini
Referências
ASSOCIAÇÃO PAULISTA DE MEDICINA (APM). Diabetes avança na América Latina e coloca Brasil no centro da crise de saúde. APM, São Paulo, 24 abr. 2025. Disponível em: <[Link da Matéria APM]>. Acesso em: [Data de Acesso].
ASSOCIAÇÃO MÉDICA BRASILEIRA (AMB). NK CONSULTORES. Diabetes é responsável por mais de 28 amputações por dia no Brasil. AMB Conecta, [S.l.], . Disponível em: <[Link da Matéria AMB Conecta]>. Acesso em: [Data de Acesso].
SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES (SBD). Brasil já tem cerca de 20 milhões de pessoas com diabetes. São Paulo: SBD, 31 jan. 2025. Disponível em: <[Link da Matéria SBD]>.
SOCIEDADE BRASILEIRA DE DIABETES (SBD). Diretriz da Sociedade Brasileira de Diabetes – Edição 2025. [S.l.]: SBD, 2025. DOI: 10.29327/5660187. ISBN: 978-65-272-1932-3.
SPONCHIATO, Diogo. ‘Epidemia de diabetes’: Brasil é o 6º com mais casos no mundo e tem alta de quase 6% em 4 anos. VEJA, [S.l.], 7 abr. 2025. Disponível em: <[Link da Matéria VEJA]>.
SPONCHIATO, Diogo; COURI, Carlos Eduardo Barra. Diabetes coloca o Brasil em um ranking preocupante — e isso é um alerta a todos nós. VEJA Saúde, [S.l.], 7 abr. 2025. Disponível em: <[Link da Matéria VEJA Saúde]>.
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