Fiocruz e MNU-RJ formam promotores populares de saúde na Cidade Alta,no RJ-radardasaude

Joabe Antonio de Oliveira

27/09/2025

No dia 18 de setembro, a equipe do projeto Saúde na favela pela perspectiva antirracista, coordenado pela Cooperação Social da Fiocruz, encerrou seu segundo ciclo formativo no Centro Municipal de Saúde (CMS) José Breves dos Santos, em Cordovil. O equipamento funciona no território da Cidade Alta, conjunto de favelas localizado na Zona Norte do município do Rio de Janeiro. O evento contou com a presença de profissionais de saúde, lideranças do Movimento Negro Unificado, promotores populares formados nos ciclos anteriores, coordenadores do projeto, psicólogos e representantes das associações de moradores. 

Promotores populares de saúde antirracista segurando uma grande faixa na frente do CMS José Breves. Na faixa está escrito "MNU e Fiocruz. Cidade Alta também tem educação e saúde"

A formação de Promotores Populares de Saúde Antirracista foi realizada entre julho e setembro em sete favelas do Rio de Janeiro: Manguinhos, Jacarezinho e Cidade Alta, localizadas na Zona Norte, Vila Aliança, na Zona Oeste, Mangueirinha, em Duque de Caxias, Rocinha, na Zona Sul, e Vila Cruzeiro, na Zona da Leopoldina. 

A iniciativa promove a formação em promoção da saúde de pessoas negras moradoras de favelas que tenham passado por violações de direitos humanos com um enfoque antirracista. A partir dos relatos feitos pelos moradores durante oficinas, rodas de conversa e dinâmicas propositivas, a equipe do projeto desenvolve os ciclos formativos para prevenção e enfrentamento ao racismo e à violência armada nos territórios de atuação do projeto. 

Para Leonardo Brasil Bueno, coordenador do projeto na Fiocruz, fazer um curso para saúde da população negra é uma iniciativa que vem amparada por dados científicos. Segundo dados das Nações Unidas e do Ministério da Saúde, cerca de 80% da população brasileira que usa o Sistema único de Saúde (SUS) se autodeclara como uma pessoa negra. 

“A Cooperação Social da Fiocruz defende que política social, política de educação e saúde é mais importante para pessoa não adoecer e sofrer do que ficar tomando remédio o tempo todo. Hoje, os estudos da Fiocruz e do Departamento de Neurociência da UFRJ dizem que apenas 1% das doenças são comprovadamente geradas só pelo fator hereditário. O restante da porcentagem é relacionado ao fator de ambiente, condições sociais, de vida e de trabalho que geram adoecimento e sofrimento”, relatou. 

Leonardo Brasil Bueno, coordenador do projeto, debate com os promotores populares de saúde antirracista dentro do espaço cidadanis do CMS.

O coordenador também enfatizou a importância das lideranças locais e da população, especialmente das mulheres negras, que possuem papel vital no funcionamento, fortalecimento e manutenção de instituições essenciais ao SUS, escolas públicas, cursos técnicos e outras iniciativas comunitárias. Segundo ele, a sobrevivência dessas estruturas depende também da participação popular e da luta por políticas públicas territorializadas. 

Equipamentos de saúde e políticas públicas 

O Espaço Cidadania do CMS José Breves dos Santos possui computadores abertos para uso da comunidade dentro da unidade de saúde. Um trabalhador que está desempregado pode utilizar o espaço para imprimir um currículo, fazer buscas em sites, se inscrever em processos seletivos e receber os estudantes locais que usam a sala para realização de estudos e pesquisas para faculdade e pré-vestibular. Para o atual gerente do CMS, Alexandre Lara, o espaço para uso da população local é funcional e resolutivo. 

“A gente também vem conseguindo monitorar nossos pacientes de tuberculose e garantir que eles façam o tratamento durante 6 meses, o que é um grande desafio pois muitos querem abandonar e, quando abandonam, a gente vai atrás deles. É isso que evita o óbito. Nós, enquanto profissionais de saúde, não podemos desistir do paciente”, afirmou Alexandre. 

Equipe do projeto de Saúde Antirracista junto com o gerente do CMS e presidentes da Associação de Moradores da Cidade Alta

O CMS é uma unidade de Atenção Primária à Saúde (APS) que oferece serviços de promoção, prevenção e cuidado integral aos territórios em que está localizada. O foco é a prevenção, diagnóstico, tratamento e reabilitação da população local. 

“A Cidade Alta não tem uma Unidade de Pronto Atendimento e os moradores questionam muito isso quando precisam de atendimento emergencial”, explicou Alexandre. Segundo a Associação de moradores, a população residente no território da Cidade Alta tem realizado uma série de denúncias relacionadas ao Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) que, mesmo após receber o chamado, não entram no território por ser área de risco. 

“A gente tem tido aos finais de semana óbitos de pessoas de extrema gravidade após os moradores solicitarem o Samu e, mesmo com o acompanhamento dos presidentes da Associação de Moradores, eles se recusam a subir no local”, relatou Lara. 

Também esteve presente do debate de encerramento Marcelo Dias, coordenador nacional do Movimento Negro Unificado, que expressou seu desejo de que a presença do Estado nas favelas não se limite ao controle e repressão. 

“Nós queremos que o Estado esteja presente nestes territórios não somente com a Secretaria de Segurança Pública, com a Polícia Civil e Batalhão de Operações Policiais Especiais, queremos que o Estado esteja presente com a Secretaria de Educação, com a Secretaria de Saúde, Secretaria de Meio Ambiente, de Esporte e Lazer”, explicou Marcelo Dias. 

Coordenadores do MNU debatem com os promotores

O debate foi encerrado com a reflexão sobre o impacto da violência na educação e na saúde da população local que precisa enfrentar o fechamento das escolas e clínicas; desmarcação de consultas; bloqueios e alterações no transporte público; além do sentimento de medo e risco de segurança para os moradores do território. 

Intervenção urbana na favela 

Após o debate, os coordenadores do projeto realizaram a entrega dos diplomas para os novos promotores populares de saúde antirracista que, acompanhados das lideranças locais e presidentes das associações de moradores, penduraram uma faixa com dos dizeres “Cidade Alta também tem educação e saúde” na entrada principal do território. 

A formação realizada pela Fiocruz em parceria com o Movimento Negro Unificado foi vista pelos participantes como um passo fundamental para fortalecimento coletivo e empoderamento da população local. 

“Essa iniciativa reflete a capacidade da comunidade de se indignar diante das injustiças, de reconhecer seus direitos e de lutar por eles. As escolas são nossas, esse Centro Municipal de Saúde é nosso. Não é do diretor ou de quem trabalha, muito menos do prefeito. O que a gente busca com essas oficinas do curso, além de fazer a discussão do racismo e dos fatores ligados ao racismo estrutural da nossa sociedade, é que a população seja multiplicadora desse conhecimento”, finalizou João Batista Carvalho, Coordenador estadual do MNU-RJ. 

Promotores populares de saúde antirracista segurando uma grande faixa na frente do CMS José Breves. Na faixa está escrito "MNU e Fiocruz. Cidade Alta também tem educação e saúde"

O 3° Ciclo de Formação de Promotores Populares de Saúde Antirracista será realizado durante os meses de outubro e novembro de 2025.A formação é gratuita e voltada para moradoras e moradores dos territórios, representantes de instituições, coletivos locais e organizações não governamentais. As inscrições estão abertas pelo formulário geral de matrículas

Sobre o projeto 

O projeto Saúde na favela pela perspectiva antirracista objetiva a formação em Promoção da Saúde com acolhimento, escuta ativa, e enfoque antirracista voltada para moradores de sete favelas do Rio de Janeiro que tenham passado por violações de direitos humanos. Também visa analisar as demandas locais frente a disponibilidade de serviços psicossociais para moradores dessas favelas na perspectiva antirracista do compartilhamento de Saberes Ancestrais, sobretudo reconhecendo e valorizando tais saberes que estão presentes nos cinco lugares de atuação do projeto. O projeto é realizado pela Coordenação de Cooperação Social da Fiocruz, em parceria com o Movimento Negro Unificado (MNU-RJ).

* Fotos presentes na matéria: Nathalia Mendonça (Cooperação Social da Fiocruz)


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