Um ano depois de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) liberar o cultivo industrial da planta Cannabis sativa para fins medicinais, o governo e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ainda patinam na regulamentação do mercado nacional, que poderá beneficiar milhares de pacientes. Especialistas e empresas veem na falta de atuação uma intenção proposital de procrastinar o tema, frente ao eventual desgaste de estabelecer regras para a produção.
Em decisão de novembro de 2024, a Corte autorizou a importação de sementes e o cultivo de cânhamo industrial e determinou que a Anvisa e a União definissem as regras em até seis meses. O cânhamo industrial é uma variedade de cannabis com teor de tetrahidrocanabinol (THC) inferior a 0,3%, que não gera efeitos psicotrópicos. A agência chegou a incluir uma minuta de regulamentação na pauta de votações de sua diretoria colegiada em agosto, mas a discussão foi adiada.
“A Anvisa já iniciou as ações necessárias para o cumprimento da determinação. Entre elas estão a coleta de contribuições da sociedade civil, a elaboração dos documentos técnicos e da minuta do ato regulatório, que será submetida à Diretoria Colegiada”, diz a agência, em nota.
Além da regulamentação da Anvisa, a decisão do STJ também cita atribuições ao Ministério da Saúde e do Ministério da Agricultura para estabelecer políticas públicas sobre o tema. Procuradas, as duas pastas não se manifestaram.
O Ministério da Saúde chegou a elaborar, em maio, um plano de ação para “regulação e fiscalização” do acesso a tratamentos com maconha medicinal. O documento, porém, previa a aprovação de uma resolução com as regras para produção nacional até setembro, o que não ocorreu.
Empresas e associações apontam que, o mercado de maconha medicinal tem crescido no país, mas a falta da regulamentação para produção no mercado nacional acaba por criar insegurança jurídica para que os investimentos possam crescer ainda mais.
Para o ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, essa regulamentação da cannabis medicinal deveria ser discutida pelo Congresso. Ele cita um projeto de lei do deputado federal Fábio Mitidieri (PSD-SE), que trata do tema, já foi aprovado em comissão especial. No fim de setembro, Teixeira encaminhou um ofício a Alexandre Padilha (Saúde) e Jorge Messias (AGU), além do presidente da Anvisa, Leandro Safatle, defendendo que o governo deve deixar o tema para ser discutido entre os parlamentares:
— A saída para a questão medicinal é a votação no Congresso de um PL que está maduro. Está apenas pendente um recurso para ir ao plenário. O Congresso é a forma mais abrangente de regulação. A decisão do STJ colocou um teto que não dá conta do tema — disse o ministro. Segundo ele, o teor de 0,3% de THC estabelecido pelo tribunal é insuficiente para o tratamento de algumas doenças. Estudos científicos apontam níveis altos de evidência de eficácia no uso de cannabis em pacientes com epilepsia, dores crônicas, autismo, ansiedade, náuseas provocadas por quimioterapia, distúrbios do sono, fibromialgia e transtornos de estresse pós-traumático.
A defesa de que este é um tema que deveria ser discutido pelo Congresso é compartilhada por outras alas do governo. O assunto não é tratado com prioridade e é considerado sensível dentro da Esplanada, especialmente com a proximidade do ano eleitoral.
Na visão do diretor da Plataforma Justa e ex-secretário da Plataforma Brasileira de Política de Drogas, Cristiano Maronna, há receio do governo de gastar capital político neste tema:
— Infelizmente, o governo Lula não tem demonstrado disposição para se envolver nessa questão, no sentido de fazer avançar a pauta. O Judiciário está tentando fazer a pauta avançar e o Executivo resistindo, criando obstáculos, evitando colocar a mão na massa — afirma Maronna.
Na quinta-feira passada, o STJ prorrogou pela segunda vez o prazo para aprovar a regulamentação, que agora passou para março de 2026. “Ao autorizar o novo cronograma, a ministra relatora Regina Helena Costa destacou a complexidade da questão e reconheceu os avanços parciais da União no cumprimento do acórdão”, disse a AGU, em nota.
Fundador da Associação Pan-Americana Multidisciplinar de Endocanabinologia, o neuropediatra Rubens Wajnsztejn vê a regulamentação ainda patinando, enquanto a adesão ao medicamento tem evoluído entre pacientes e a classe médica:
— O preconceito está muito arraigado na classe médica, mas conforme as pessoas vão se informando, isso vai reduzindo. Ainda há muitos entraves, não estamos numa situação confortável.
Desde 2015, a Anvisa autoriza a importação de produtos à base de cannabis com prescrição médica e, a partir de 2019, regulamentou a comercialização no país com matéria-prima importada. O cultivo no Brasil, porém, só é autorizado em casos excepcionais, com autorização judicial.
No mercado brasileiro desde 2018, a Ease Labs tem sua plantação na Colômbia e produção no Brasil. O co-CEO da empresa, Gustavo Palhares, afirma que há crescimento médio de 54% nas vendas nos últimos quatro anos, com adesão de 60 mil médicos brasileiros que prescrevem medicamentos com cannabis no país. Quando a regulamentação for implementada, a expectativa da empresa é poder cultivar no Brasil, seguindo as regras do novo modelo proposto:
— Em outros países, isso foi favorável à redução de custos. Temos toda a tecnologia e podemos trazê-la para o Brasil, na medida do que for possível cultivar.
Source link
Você pode se precisar disso:
Produtos Recomendados

Ômega 3 1000mg Rico em EPA DHA com Selo IFOS e Vitamina E – 60 cápsulas Vhita-radardasaude
Ver na Amazon* Links de afiliado. Podemos receber uma comissão por compras qualificadas.
Conteúdo Indicado



